Pressionado pelo Conselho de Ética e pela Procuradoria Geral da República, futuro do presidente da Câmara é incerto

Cunha pode conseguir uma punição mais branda no Conselho de Ética
Agência Brasil
Cunha pode conseguir uma punição mais branda no Conselho de Ética
Talvez o fato de o pedido de impeachment aceito contra a presidente Dilma Rousseff ter sido apenas um entre dezenas de protocolados em 2015, e de ter sido assinado por três pessoas, justifique o protagonismo no processo desempenhado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Só talvez. O que parlamentares contrários e favoráveis a Cunha dizem, porém, é que só alguém como ele teria forças para degringolar este episódio da crise política.
As características de um embate pessoal com o governo em alguns momentos começaram logo no início do ano: Cunha não perdoa o Planalto por ter apoiado outro candidato à presidência da Câmara. Depois de passar quase 12 meses no comando da Casa, de romper oficialmente com o governo, utilizar o ataque como estratégia de defesa em entrevistas nas quais, por exemplo, chamou Dilma de mentirosa, não é possível prever o que acontecerá com um dos homens mais poderosos do País. Se Eduardo Cunha sobrevive até o fim de 2016, se sai ileso, se perde o mandato ou somente a presidência da Câmara, as apostas já estão sendo feitas por estrategistas e integrantes do jogo político.
O principal dilema com relação ao futuro do deputado passa pela tramitação do processo que corre contra ele no Conselho de Ética da Casa. O colegiado já foi palco de disputas que tiveram repercussão devido ao nível inflamado com que aliados e adversários defenderam suas posições, e por conta das consecutivas jogadas de Cunha para protelar a abertura da investigação. De bate-boca às vias de fato, de acusações a destituição de relator, o conselho somente conseguiu dar continuidade ao processo após tentar por oito vezes consecutivas. Mais uma vez, porém, a investigação pode voltar à estaca zero, já que a aprovação do parecer do relator, ocorrida em meados de dezembro, pode ser anulada pela Comissão de Constituição e Justiça da Casa.
Janot foi um dos alvos de Cunha e deve manter a artilharia depois do fim do recesso
Divulgação/Supremo Tribunal Federal
Janot foi um dos alvos de Cunha e deve manter a artilharia depois do fim do recesso
Quem acompanha de perto as negociações não descarta a possibilidade de o cenário ser revertido favoravelmente ao presidente da Câmara. Segundo essa hipótese, o pedido de cassação poderia ser rejeitado, e os deputados poderiam transformá-lo em uma pena alternativa. Mesmo se houver um parecer pedindo a saída de Cunha, o que é mais provável, a decisão não seria inédita, pois já houve casos em que a maioria do colegiado discordou da proposta do relator e acatou pena mais branda. Nesse caso, os deputados encontrariam um meio termo para o imbróglio: nem cassação, nem absolvição. Uma suspensão temporária, nesse caso, poderia ser a melhor saída.
Já os mais próximos do peemedebista avaliam que ainda é cedo para prever os próximos passos, já que o futuro depende de outras movimentações importantes. Sinalizando apoio também ideológico às posições de Cunha, um importante aliado diz que o País não será mais o mesmo após março. Nessa época, acredita, a situação de Dilma Rousseff à frente do Executivo será irreversível.
Esse interlocutor prevê que no caso de ser bem-sucedido o processo impeachment, o País terá outras questões prioritárias para resolver, como por exemplo a retomada do crescimento. Esse eventual governo de coalizão, portanto, não poderá desprezar alguém que tem “200 votos no Congresso Nacional”.
Mas o tempo corre contra o presidente da Câmara, discordam os que querem ver longe o desafeto do Planalto. A avaliação de um de seus adversários é de que ele perdeu o espaço com o qual ainda poderia negociar algum acordo. O diagnóstico, segundo o observador, é de que Cunha acabou radicalizando seus movimentos ao se tornar um político movido às revanches.
Num ato de revolta, deputados protestaram contra Cunha. Mara Gabrilli perguntou ao peemedebista:
Gustavo Lima / Câmara dos Deputados - 19.11.15
Num ato de revolta, deputados protestaram contra Cunha. Mara Gabrilli perguntou ao peemedebista: "O senhor está com medo?"
Com isso, avaliam os críticos, ele teria se isolado de partidos importantes da Casa, que não mais o apoiam publicamente, como o PSDB e o PT. O homem que surgiu no cenário político como um estrategista frio teria se tornado um líder político instável. Nesse sentido, “quanto mais manobras” ele faz, maiores as chances de ser afastado da Presidência e, pior, acabar com o mandato cassado ainda em 2016.
A deflagração do processo de impeachment contra a presidente Dilma se tornou emblemática nesse impasse. Ao mesmo tempo em que fez Cunha não ser mais o único centro das atenções, a população que acompanha à distância os acontecimentos em Brasília ficou com a impressão de que, após ter sido denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), ele não tinha mais condições de conduzir um processo tão melindroso quanto este.
Com base nessa dualidade, uma das fichas a ser apostada pelo presidente da Câmara será continuar disputando forças com o governo. O objetivo será adiar ainda mais o processo contra ele e, assim, tentar esticar o embate até o meio do ano. Nesse período, os parlamentares entram em recesso e parte deles começa a se preparar para as eleições municipais, o que pode atrasar os procedimentos até 2017.
Cunha se enfraqueceu depois de ser abandonado por petistas e tucanos (foto)
Lucio Bernardo Junior/ Câmara dos Deputados - 11.11.15
Cunha se enfraqueceu depois de ser abandonado por petistas e tucanos (foto)
Para isso, o peemedebista conta com a personalidade forte e com o fato de nunca levar desaforos para casa. Em diversos momentos em que se viu acuado, Cunha acusou o Palácio do Planalto, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, e chegou a pedir a investigação de companheiros de partido: “E a denúncia contra o [presidente do Senado] Renan [Calheiros]?”, queixou-se.
É com base nesses fatos que há um consenso entre os observadores de Eduardo Cunha de que a única coisa que não se verá nos próximos meses será a sua renúncia. Outro perfil quase unânime é de que ele construiu uma relação de confiança e gratidão entre os deputados da Câmara. Não se trata apenas de um apoio formal ou aliança devido às circunstâncias partidárias: desde antes de se candidatar à presidência, ele sempre atendeu a vontade de muitos parlamentares, o que o fortalece em momentos de necessidade.
Além disso, em julho, em ato incomum para a época do ano, Cunha gravou um pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão, no qual fez um balanço das principais votações da Casa no primeiro semestre. Em tom elogioso, o presidente da Câmara elencou aumentos na produtividade dos deputados e citou a “Câmara independente” que tem dado “respostas mais rápidas” a “problemas urgentes”.
Em 2014, quando liderou a rebelião contra o governo que formou o chamado blocão, Cunha patrocinou uma série de derrotas ao Planalto por meio de deputados insatisfeitos da própria base aliada. Desde então, o presidente da Câmara passou a ser visto com um quadro que consegue comandar discussões de vários temas e, ao mesmo tempo, acelerar ou retardar votações de interesse de seus pares e reivindicar uma independência do Legislativo em relação ao Executivo, demanda antiga dos parlamentares.
Essa fidelidade, no entanto, pode ter um limite: “o abraço dos afogados”. A gota d’água dos apoios públicos a Cunha poderá ser a apreciação em plenário do que for deliberado no Conselho de Ética. Neste caso, com a votação aberta, a pressão popular pode fazer com que os aliados de Cunha virem as costas ao líder, até para que possam se preservar.
Há algumas semanas, o movimento foi ensaiado por parte dos deputados após um discurso de Mara Gabrilli (PSDB-SP), em que pedia com todas as letras: “Chega, senhor presidente. O senhor não consegue mais presidir. Levanta dessa cadeira, Eduardo Cunha”. Após o discurso da deputada, parlamentares saíram do plenário reagindo ao fato de ele ter convocado sessão de votação no plenário no intuito de impedir o andamento do processo contra ele no Conselho de Ética.
Nessa ocasião, ocorrida em novembro, o número de gritos de “Fora, Cunha!” ainda não foi suficiente para gerar grande rebelião, mas a quantidade de opositores poderá crescer se a imagem da Câmara continuar sendo desgastada perante a opinião pública.
Co Portal IG.

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